Padre Frans Van der Hoff, um dos principais pioneiros do Comércio Justo, faleceu aos 84 anos em 13 de fevereiro de 2024 em sua casa em Barranca Colorada, Ixtaltpec, em Oaxaca, México.
No início da década de 1980, após o golpe de Estado contra Salvador Allende no Chile, o Padre Frans, um padre operário holandês, mudou-se para o México, onde se integrou nas comunidades indígenas produtoras de café. Lá ele conheceu a injustiça do negócio: os atravessadores ficavam com os lucros, enquanto os indígenas recebiam muito pouco. Depois, com o apoio da organização Solidaridad e junto com Nico Roozen, iniciam a aventura de gerar um vínculo comercial direto entre os produtores organizados na União das Comunidades Indígenas da Região do Istmo (UCIRI) no México e os consumidores conscientes na Holanda, um vínculo que permitiu às famílias do campo começarem a ver os frutos do seu esforço.
“Juntos eles se organizaram para lutar e ver alternativas para que eles próprios pudessem ser donos do seu produto final para o consumidor, e foi por isso que em 1988 formamos o Comércio Justo na Holanda, mas com base nessa experiência (de UCIRI), sim, pode ser feito, mas tem que ser bem organizado e também politicamente coerente. E não é pedir esmola, é pedir uma remuneração pelo trabalho investido, por isso o preço mínimo”, afirmou o padre Francisco.
Enquanto os(as) produtores(as) se organizavam, nos países consumidores(as) começaram a oferecer produtos sob o conceito de comércio justo através de lojas do terceiro mundo na Europa. Na Holanda, o Padre Frans, Nico Roozen e Solidaridad fundaram a primeira certificação de Comércio Justo em 1988 sob o nome de Max Havelaar, inspirado num livro sobre a exploração dos produtores(as) de café na Indonésia durante a época colonial.
“É possível um mundo mais solidário, apoiado por uma ética do bem comum que se preocupa com o planeta Terra e com toda a humanidade”, disse Van der Hoff.
Em março de 2023, o Padre Frans reuniu-se com o conselho da CLAC e do Fairtrade Internacional na cidade de Mérida, em Yucatán, México. Nessa reunião enfatizou a importância de relembrar as origens do Comércio Justo como um modelo comercial alternativo que deve estar sempre ligado à melhoria das condições de vida dos pequenos(as) produtores(as).
A CLAC lamenta a morte do Padre Frans e recorda o legado inestimável que deixou ao imaginar e promover um comércio alternativo, mais justo e equitativo para os produtores(as). CLAC reconhece o seu incansável compromisso, trabalho e contribuições para mudar a vida das famílias de produtoras em todo o mundo, capacitando os produtores(as) para lutar por melhores condições comerciais, sendo um dos fundadores de um sistema que enfrenta o desequilíbrio na distribuição de poder e valor através de um conjunto de ferramentas e intervenções.
“Em 2004, como CLAC, recebemos as bênçãos do Padre Frans, quando decidimos nos unir como continente em uma única organização de pequenos(as) produtores(as) da América Latina e do Caribe para incidir e garantir o comércio justo”, disse Marike de Peña. presidente do Conselho Diretivo da CLAC.
“Durante todos estes anos tivemos o apoio incondicional do Padre Frans, a sua sabedoria, visão, reflexões estratégicas e orientação guiaram-nos no caminho da luta por um mundo mais justo e equitativo. Hoje perdemos um grande amigo e mentor, mas o seu legado permanece vivo em cada um de nós. Padre Frans acreditou firmemente na força do produtor, da comunidade e dos valores que nos unem, deu-nos identidade como continente e uma missão a seguir, nos sentimos privilegiados e gratos. Obrigada, padre”, acrescentou.
Por sua vez, a equipe e o conselho de diretores do Fairtrade International publicaram num comunicado: “Ele concebeu o Fairtrade como uma espécie de laboratório social que testou novas ideias radicais, experimentou formas inovadoras de regular o comércio e teve sucesso porque as pessoas e a Justiça sempre vieram primeiro. Hoje, esse sucesso é o Sistema Global Fairtrade, composto por mais de dois milhões de produtores, agricultores e trabalhadores em mais de 70 países. Continuaremos a liderar pelo exemplo e a desenvolver o seu legado para criar um futuro melhor para todos.”
Ao longo da sua vida, o Padre Frans escreveu pelo menos uma dezena de livros sobre comércio justo e teologia, entre os quais se destacam: “Manifesto dos Pobres, as soluções vêm de baixo”, “Excluídos hoje, protagonistas amanhã” e “A aventura do comércio justo: uma alternativa à globalização” com Nico Roozen.
Padre Frans era doutor em Antropologia e Economia Política e doutor em Teologia e Sociologia Rural. Além disso, recebeu um doutorado honorário da Universidade Católica de Lovaina, na Bélgica, por seus esforços para promover uma economia alternativa. Em 2005 recebeu a nomeação de Cavaleiro da Legião de Honra do presidente francês, Jacques Chirac; e em 2006 o Prémio Norte-Sul atribuído pelo Conselho da Europa.
Uma delegação composta por membros do conselho diretivo, da junta de vigilância e da equipe operativa da CLAC, além da Coordenadora Mexicana de Pequenos Produtores de Comércio Justo, acompanhou as cerimônias fúnebres e sepultamento do Padre Frans Van der Hoff em Oaxaca, México.
